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A “visão de túnel” na educação dos filhos e na gestão das empresas

A “visão de túnel”

Como psicoterapeuta e como consultor em empresas, não é raro encontrar situações em que a posição de pais e executivos foca apenas no resultado, sem considerar suas causas de forma apropriada. É o que denomino “visão de túnel”, adaptando definição utilizada por Smith em outro contexto¹.

Mães e pais querem o sucesso de seus filhos. Quando o adolescente vai mal na escola e ameaça não passar de ano, o sinal de alerta é disparado e os pais correm para contratar aulas particulares em tempo de evitar a temível “bomba”. A exigência aumenta, a pressão é maior, a cobrança é inevitável. Pais passam a vigiar se o jovem está à toa, perdendo tempo no celular enquanto poderia estar estudando. Poucos educadores se dão ao trabalho de investigar as causas do fracasso escolar. Inferem apressadamente que se trata de malandragem, já que seu filho ou sua filha é “super inteligente”. Todo o foco está concentrado nas notas das provas e no boletim. A meta final é o que interessa. E será até objeto de prêmio no caso de ser alcançada. O que importa é encontrar a saída do túnel escuro. A percepção está enviesada pela visão de túnel.

Situação semelhante ocorre em empresas que não estão entregando os resultados esperados pelos acionistas. Os executivos são pressionados a aumentar o nível de controle sobre os seus subordinados, as medições da produção passam a ser diárias ou até mesmo por turnos de trabalho. Campanhas são disparadas de forma a conscientizar e motivar os trabalhadores a se superarem em busca da meta. Todo o foco está concentrado nos números finais da produção ou das vendas. E, claro, na distribuição de lucros e resultados, no caso do atingimento das metas. Assim como os pais desesperados com a possível repetência do filho, os executivos miram obstinadamente o alcance dos resultados planejados: visão de túnel.

Focar nas metas sem saber as causas do atual mau resultado é ver a realidade de forma parcial, reducionista. Tive o privilégio de escrever com Betania Tanure a trajetória profissional de Fábio Barbosa em sua carreira de CEO dos bancos ABN-AMRO, Real e Santander². Um dos lemas de suas moedas de valor é: “resultado é o que resulta”. Concordo. É preciso fazer um bom diagnóstico da situação para saber as intervenções que são necessárias para promover as consequências almejadas. Não é raro mães desconhecerem o estado de depressão de seus filhos e continuarem cobrando deles que as notas melhorem. Sequer imaginam que a droga e o álcool podem estar sendoinutilmente utilizados pelo filho como remédio para a sua falta de energia e propósito. Da mesma forma, nas empresas, é preciso conhecer as causas do subdesempenho, que muitas vezes não está apenas em uma área ou outra, mas também entre as áreas.

Quando as causas de um mau resultado não são conhecidas, focar somente no resultado será outro fracasso. Para evitá-lo, os pais mudam o filho de colégio, onde o nível de exigência é menor. Nas empresas, a visão de túnel é acompanhada da “visão míope”, aquela que só enxerga o curto prazo, quando só há medidas de performance para o que é imediato. Buscar resultados sem fazer a conexão com suas causas promove a busca de atalhos para chegar ao alvo mais depressa. A crise econômica internacional de 2008 já ensinou ao mundo corporativo este risco.

Resultados são importantes e não devem ser desconsiderados de forma alguma. Alcançá-los exige conhecimento, planejamento, disciplina, visão do todo, avaliação constante e muita energia e vontade. Pais deveriam buscar compreender o que está acontecendo com seus filhos quando eles não estão indo bem na escola. Empresas devem realizar mapeamentos de sua cultura organizacional para identificar as causas da
baixa produtividade. Há especialistas para ambas as necessidades.

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1 SMITH, P. On the unintended consequences of publishing performance data in the public sector. International Journal of Public Administration, v. 18, n. 2–3, p. 277–310, jan. 1995.
2 TANURE, B; PATRUS, R. Os dois lados da moeda em fusões e aquisições: o case da F&A dos bancos ABNAMRO, Real, Sudameris e Santander. Rio de Janeiro: Elsevier, 2011.

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